quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Número 3, inspirações trazidas pelo vento
Me contaram uma história um dia desses que falava sobre um país distante, num mundo distante. Esse lugar era cheio de natureza, e pelas ruas das cidades pairava um ar diferente, como se houvesse uma aura mágica sempre presente, causando arrepios nas espinhas e pequenos choques de prazer na pele. As águas das fontes formavam cortinas de gotículas brilhantes que umedeciam os lábios de quem respirava, e o vento do campo que corrias por entre as alamedas deixava o hálito de todas as pessoas com o frescor e o cheiro doce da primavera. As pessoas gostavam de morar nesse lugar. Quase todos eram felizes ali. Mas o tempo passa sem parar para contemplar a beleza da vida, e as coisas mudam, e as pessoas também, e nada pode continuar para sempre. A primeira coisa que mudou foi a mágica da cidade, e as pessoas começaram a retirar dela um novo tipo de prazer. Os arrepios desciam até suas partes íntimas, e os olhares, ao se cruzarem, faziam o coração bater forte, e cada toque era sentido e vivido como o mais puro êxtase. O vento se abafou, mas nunca parou de soprar. O ar úmido passando pelas frestas fazia soar uma doce melodia, mais doce do que as respirações tinham sido um dia, e o hálito quente agora lembrava o sabor da noite, do orvalho e da lua. A cidade tornou-se quente, e todos passaram então a se vestirem de branco, a até a luz ficou mais branca. E tudo ficou tão puro, que as carícias cheias de paixão se faziam também com a inocência de uma infância que ficara para trás, e o amor que se trocava era a cada momento a coisa mais linda do universo. As fontes saturavam o ar com suas gotas, mas estas refrescavam o ar onde pairavam, e saciavam a sede dos passantes, grudavam em suas peles e escorriam por seus corpos, deixando trilhas sinuosas por entre seus decotes. Algumas pessoas partiram, outras chegaram. A cidade, o país, nunca mais foram os mesmos. E mesmo assim não era necessariamente pior nem melhor. Alguns odiaram a mudança, o tempo, e odiaram a vida, e então para eles não havia mais espaço lá. Pois não havia mais lugar para tanto ódio em meio à brancura. E isso talvez fosse a pior coisa de todas, pois todo mundo precisa de um pouco de raiva às vezes. E muitos sofreram, e choraram pelos que partiram, e quiseram que não chegassem outros. Mas chegaram, e ficaram, e foram depois queridos tanto quanto aqueles que há muito tinham partido. E muitos se acostumaram, e ficaram mais felizes ainda com o jeito novo das coisas, e quiseram que dessa vez fosse para sempre. Mas não podia ser, e em algum momento as coisas começaram a mudar de novo. Dessa vez o que mudou primeiro foi o vento, que começou a soprar o cheiro de novas terras, e o cheiro do mar, e o cheiro de temperos exóticos e de frutas de terras distantes. E tudo mudou mais uma vez.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
O que mudou foi que os homens comeram o fruto proibido do paraíso? Esse Luciraldo...
ResponderExcluir